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BR Trans: Com direção da gaúcha Jezebel de Carli
BR Trans: Com direção da gaúcha Jezebel de Carli

HISTÓRIAS DE VIDAS SINGULARES

 

ENTRE A TRAGÉDIA E O HUMOR, ESPETÁCULO CEARENSE-GAÚCHO “BR TRANS” RETORNA A PORTO ALEGRE CONSAGRADO NACIONALMENTE.

 

O ator cearense Silvero Pereira precisou enfrentar o preconceito do meio artístico e da sociedade para criar um dos espetáculos mais elogiados do Festival de Curitiba de 2014.  Estreado em Porto Alegre em 2013, com direção da gaúcha Jezebel de Carli (da Santa Estação Cia.de Teatro), BR TRANS retorna à capital, consagrado pela crítica nacional e pelo público, para novas sessões, hoje e amanhã, no Teatro de Arena.  As apresentações integram a programação paralela da 10ª Bienal do Mercosul, em diálogo com o segmento APARATOS DO CORPO, exibido na Usina do Gasômetro.

- A classe artística do Ceará tinha a ideia de que os transformistas são pessoas que não se aceitam sexualmente e utilizam a arte simplesmente como desculpa para se vestir de mulher.  Mas desde o teatro grego antigo, passando pelo teatro elisabetano, o transformista sempre teve seu lugar – afirma Pereira.

 

Na contramão das representações estereotipadas dos travestis no teatro e no audiovisual por meio de sua faceta mais exótica e debochada, BR TRANS descortina os dramas humanos de vivências que se equilibram entre a tragédia e um humor ressignificado como válvula de escape de um cotidiano que é frequentemente de violência.  Em cena, na pele da personagem Gisele, Pereira narra histórias e canta acompanhado do músico gaúcho Rodrigo Apolinário.

 

A pesquisa de campo envolveu entrevistas com travestis, transexuais e transformistas do Rio Grande do Sul (no Presídio Central, na Avenida Farrapos e no meio acadêmico) e do Ceará, mas o que diferencia o trabalho é uma convivência de longa data com o universo trans, iniciada em 2002, que se traduziu em um material singular.  Esta pesquisa “epidérmica”, segundo Pereira, foi motivada pelo princípio antropológico de interferir o mínimo no espaço investigado para absorver o máximo.  Por isso, ele explica que não apresenta uma interpretação ou um mero ponto de vista, mas uma atuação que revela uma vivência:

- É um espetáculo documental.  É como abrir um diário de pesquisa do ator para o espectador.  Tudo que é dito no espetáculo eu presenciei ou tive acesso, pois acabei vivenciando esse universo com propriedade e respeito.  Mas esse envolvimento vai além da pesquisa.  Hoje, isso transcende a questão do ator e diz respeito à minha amizade com travestis, transexuais e transformistas.

 

 

O ator relata que foi sensibilizado para o tema quando passou a morar em uma comunidade onde viviam travestis e constatou que os homens que se relacionavam com elas à noite eram os mesmos que as maltratavam no outro dia.  Passou a utilizar o teatro para contar essas histórias, de início sem pretensão “política” ou “militante”.  Em 2005, estreou o primeiro espetáculo sobre o tema, UMA FLOR DE DAMA (apresentado em cidades gaúchas em 2014), com o Coletivo As Travestidas, reunindo artistas de diversas linguagens.  O objetivo da pesquisa não era enfocar a questão da violência, mas o tema se impôs durante o processo.

- O Brasil está em primeiro lugar no ranking de assassinatos de travestis e transexuais no mundo, seguido pelo México.  É um dado muito alarmante.  Somos uma sociedade que finge ser democrática, mas é preconceituosa e violenta – diz Pereira.

 

                                   

Jezebel, a diretora, comemora com o ator a visibilidade alcançada por BR TRANSA desde o Festival de Curitiba, o que motivou convites para novas temporadas e rendeu frutos.  Um filme inspirado na peça deve estrear entre o final de 2016 e o início de 2017.  No ano passado, o Coletivo As Travestidas estreou um novo espetáculo, QUEM TEM MEDO DE TRAVESTI, que deve chegar a Porto Alegre no primeiro semestre de 2016, e já prepara dois novos trabalhos para o ano que vem.  Sobre o sucesso de BR TRANS, Jezebel constata:

- É um grande ator em cena, que tem uma potência e um trabalho técnico.  Trata de um tema sobre o qual está na hora de se falar com propriedade, e não de forma superficial.  Mas a peça vai além do universo trans para falar do humano, das diferenças.  Quem não passou por uma humilhação na vida?

 

CINCO REFERÊNCIAS CULTURAIS DO UNIVERSO TRANS

 

TOMBOY

No longa-metragem francês de 2011, dirigido por Céline Sciamma, uma menina se muda com a família para uma nova localidade, onde se apresenta como menino aos amigos.

 

DZI CROQUETES

Lançado em 2010, o documentário de Tatiana Issa e Raphael Alvarez recupera a história do grupo carioca que afrontou o moralismo nos anos 1970 com espetáculos irreverentes.

 

RUPAUL’S DRAG RACE

Neste reality show, os concorrentes a maior drag queen dos Estados Unidos têm de provar que sabem criar looks e apresentar performances musicais.

 

MANIFESTO CONTRASSEXUAL

Publicado em 2002, o livro da espanhola Beatriz Preciado aborda a sexualidade além de binarismos como homem/mulher.  N-1 Edições, 224 páginas.

 

LUIS ANTONIO – GABRIELA

Apresentada na Capital em 2012 e 2013, a peça de Nelson Baskerville é um pedido de desculpas poético a seu irmão homossexual, que morreu longe da família.

 

Fonte:  ZeroHora/Fábio Prikladnicki (fabio.pri@zerohora.com.br) 26/11/2015